Pedagogia empreendedora
Startups e educação: qual é a liga?
Contextualização do tema
Recentemente, fui a um evento diferente, em São Paulo, chamado Case. O objetivo do encontro foi reunir pessoas empreendedoras, que, além de verem as mudanças acontecerem, queriam fazer parte dela. Participei ativamente e descobri que de fato o objetivo proposto foi atingido, pois encontrei lá muitos jovens hábeis, prontos para liderar negócios que haviam criado, denominados startups.
Esse nome diferente tem um significado próprio, conforme aponta Yuri Gitahy, especialista em startups, em um artigo da Revista Exame:
“Uma startup é um grupo de pessoas à procura de um modelo de negócios repetível e escalável, trabalhando em condições de extrema incerteza.”1
Diante de um mundo em profunda revolução e transformação, é fácil entender a incerteza. E dentro desse cenário das startups as perguntas que surgem são: o modelo de negócio pode dar certo? Tem como se sustentar? O que pode impactar o negócio?
O conceito de startups aponta um modelo de negócio repetível. Isso significa encontrar mecanismos para entregar um serviço ou produto de forma ilimitada, em grande escala. Da forma tradicional isso não é tão viável, mas por meio do digital, das novas tecnologias e principalmente da internet no processo a expansão do negócio fica facilitada, com produtos a baixo custo, e a venda se torna repetível. Como exemplo podemos citar o modelo “pay-per-view” de filmes, distribuído para centenas de milhares de pessoas, e que por isso mesmo apresenta algumas das características citadas: é repetível e escalável.
Foi em 1996 que esse movimento para criação de startups se iniciou no Brasil, sempre mais potente por ter a internet como aliada. Embora recente, a sua base se deu dentro da visão de empreendedorismo, um assunto bastante discutido e fomentado no país.
Agora vem um dado curioso. Durante o Case SP, conversei com alguns jovens empreendedores, criadores de startups, e soube então que eles foram estimulados a esse tipo de atividade enquanto frequentavam a escola – públicas e privadas. Esse dado me fez buscar mais informações sobre a relação entre empreendedorismo e educação.
Startups (empreendedorismo) e educação
Muito embora eu soubesse das iniciativas de empreendedorismo de algumas escolas, foi realizando pesquisas mais minuciosas sobre o tema que descobri a Pedagogia Empreendedora, uma metodologia de ensino que pode ser aplicada da educação infantil ao ensino médio. Vamos às minhas descobertas.
FERNANDO DOLABELA, um dos principais representantes dessa pedagogia, apresenta a proposta empreendedora na linha das temáticas transversais, aplicada como prática interdisciplinar, em sua obra Pedagogia Empreendedora.
Na prática, tudo parte de um sonho do aluno, que envolve o desejo de chegar, de ser ou de estar, e na sequência todo um trabalho é estruturado para a busca da realização do sonho. Nesse processo, o erro e os resultados indesejáveis são superados como parte do saber empreendedor, encarado como a forma de ser, e não apenas de fazer. Portanto, o aluno que é ensinado dentro da Pedagogia Empreendedora aprende que todo ser humano nasce com a capacidade de empreender, e que esse potencial pode ser estimulado quando cada um parar para pensar em seu sonho e na realização desse. Conforme menciona Dolabela (p. 60):
Ao não abraçar o aproveitamento do sonho como elemento que dá intencionalidade à vida e subsidia um projeto existencial, nossa cultura comete um imenso desperdício. A separação entre o sonho (vontade, desejo, projeto de vida, objetivo existencial, busca de autorrealização) e a sua realização pode estar na base de uma fragmentação que provoca efeitos danosos tanto à felicidade como à capacidade de fazer dos indivíduos e, portanto, da coletividade – a dissociação de duplas inseparáveis, como trabalho e prazer, esforço pessoal e desejo, aprendizado e significado, autorrealização e felicidade.
Nesse processo, a escola vai se preocupar em conectar o sonho à sua realização, e assim dar todo o suporte no campo do encaminhamento pedagógico, iniciando por um programa curricular que parte das seguintes perguntas: qual é o seu sonho e como buscará realizá-lo? A partir disso, o aluno é estimulado a registrar os caminhos tomados, além de receber suporte com atividades didáticas que o ajudarão na caminhada em busca da realização do sonho.
No fim do ano letivo, o aluno apresenta sua produção, como cita Dolabela: “Aqui está a descrição do que fiz para formular meu sonho e do esforço que desenvolvi buscando realizá-lo”.
Dessa forma, o trabalho com foco no empreendedorismo tem firmado suas bases a partir da escola, cercado de ética e valores humanos, e por meio dela tem aberto novos caminhos educativos, que não só são viáveis como já se fazem ver em resultados tão tangíveis como esses dos ex-alunos de escolas públicas e particulares que encontrei no evento de empreendedorismo.
Para fechar, fica aqui um recado importante de Dolabela para os sistemas de ensino e escolas:
A Pedagogia Empreendedora jamais poderá ser imposta. Sua adoção é uma decisão política de cada escola, congruente com sua visão de mundo. Por exigir grande energia do corpo para conduzir as mudanças que suscita, é imprescindível total compromisso da escola. A implementação invasiva é inadequada não só porque a metodologia pressupõe cooperação para a construção coletiva – e esta depende de liberdade –, mas também pela necessidade de recriação da metodologia pelo professor, o que exige empenho e convicção. A única forma de implementar a Pedagogia Empreendedora será pela construção de instrumentos didáticos adequados às peculiaridades e aos modos próprios de ser dos atores envolvidos, ou seja, a escola, o professor, os alunos, a comunidade.
* Referência: Dolabela, F. Pedagogia Empreendedora. São Paulo: Cultura, 2003.
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