Construindo conhecimento
Entre as muitas espécies de pássaros, o joão-de-barro é conhecido pela sua habilidade de construir seu ninho utilizando o barro como matéria-prima. Na Escola Municipal Professora Severina dos Ramos de Souza, em Itaguaí, a ave dá nome a um projeto cuja base é o estudo da botânica e que, aos poucos, também está construindo uma nova realidade na vida de muitos alunos.
A atividade é desenvolvida pelo professor de Ciências Carlos Damião França com alunos do 6º ao 9º anos e acontece no contraturno das aulas curriculares. Os primeiros passos se deram em 2006, quando o educador lecionava em outra instituição do município e sentiu a necessidade de abordar com seus alunos aspectos ambientais. Mas foi na atual escola em que trabalha, a partir de 2013, com a chegada de uma nova gestora, que o projeto ganhou corpo. “Costumo dizer que eu sou mera mediadora do processo. Quando o professor me apresentou o João-de-barro, assim que eu assumi a direção, falei que iria ajudá-lo a fazer com que esse projeto decolasse, pois é muito bom, mas precisa de suporte, de parceria, algo que estamos encontrando na Secretaria Municipal de Educação”, conta a diretora-geral Taylane Alves.
Com o apoio da direção, o professor Carlos foi tecendo o projeto, tentando despertar o interesse dos estudantes. Como se trata de uma atividade opcional, no início, apenas seis pessoas se inscreveram para participar, fato que não o desestimulou de continuar insistindo. “Os alunos tinham dificuldade de aprender Botânica, dentro do reino vegetal, e sair no entorno da escola para tornar esse estudo mais concreto foi uma alternativa. Passamos a coletar, classificar e a estudar as características morfológicas das folhas. Ao mesmo tempo, ia semeando neles o respeito ao meio ambiente, e o projeto foi ganhando várias vertentes, que são as oficinas de Mata Atlântica, de saúde, da água e do lixo”, explica o docente. Assim como um joão-de-barro construindo seu ninho, o professor Carlos foi vendo a atividade crescer e ganhar consistência. Hoje, as oficinas já contam com cerca de 40 alunos inseridos e uma grande fila de inscritos aguardando vaga.
O projeto já ultrapassou os muros da escola e, em 2013, participou pela primeira vez da Feira de Ciências, Tecnologia e Inovação do Estado do Rio de Janeiro (Fecti), conquistando o honroso 3º lugar abordando o tema “Chave de Identificação Dicotômica para as espécies arbóreas com folhas simples da comunidade de Coroa Grande, em Itaguaí”. A excelente colocação fez com que as alunas Ana Carolina Souza e Yasmin Macedo fossem a Olinda, Pernambuco, representar o Rio. “Quando entrei nesse projeto, não imaginava que iria tão longe. Fomos as únicas na categoria científica, e representar o nosso estado nos deixa orgulhosas”, diz Ana. “Lá, nós trocamos experiências com alunos de todo o Brasil e conhecemos outros projetos também”, completa Yasmin.
De acordo com a coordenadora pedagógica Andréa de Lemos Nascimento, o projeto está ajudando a transformar a escola. Os alunos passaram a ter a oportunidade de permanecer durante todo o dia na instituição e, graças a esse envolvimento, as notas melhoraram, assim como o comportamento de alguns deles que, antes vistos como problemas, passaram a ser bons exemplos. “Os estudantes estão cada vez mais motivados, se oferecem para participar, são convidados a comparecer a outras escolas para falar sobre o projeto e, quando retornam, compartilham com os outros colegas como foi a experiência. A consequência disso é a melhora da disciplina na escola e a vontade de querer estudar cada vez mais. Essa atitude também estimula todos os outros professores, que já pensam em desenvolver atividades, nas suas disciplinas, que possam ser inseridas no João-de-barro”, declara. A diretora adjunta Danielle Guimarães completa: “O projeto está atuando como um agente de mudanças na vida desses alunos e pode ser a porta de ingresso para uma escola técnica ou mesmo uma faculdade, mais à frente”.
A atividade não para mesmo de crescer. Para a Fecti de 2014 foram selecionados outros dois temas: “Diagrama e fórmula floral” e “Morfologia do fruto”. O aluno Gabriel Mitrano participa do projeto desde o ano passado e faz questão de declarar o seu amor por ele: “O João-de-barro serve para quem gosta de Biologia, como eu, e até para quem não gostava e passou a entender do assunto. A gente aprende como é a vida das plantas e o impacto que podemos causar a elas”. A aluna Bárbara Victoria concorda: “O projeto faz a gente descobrir as características específicas de determinado fruto. Estudamos as espécies e, agora, quando olhamos para uma planta sabemos muitas coisas sobre ela”. Muito mais do que os prêmios conquistados em feiras de ciências, alunos e professores sabem que a maior vitória já está sendo obtida no dia a dia da escola. A postura que os estudantes passaram a ter com o estudo comprova que essa conquista se dá dentro de cada um deles. “Ver a motivação e o envolvimento desses alunos não tem preço. Estamos formando cidadãos críticos e participativos, implantando o costume de buscar o conhecimento. É esse perfil pesquisador que tentamos incutir em cada um deles”, conclui a diretora Taylane Alves.
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