A copa do mundo de 2018. Prepare-se para emoções fortes


A copa do mundo de 2018 chega a suas fases decisivas e felizmente o Brasil segue firme. Nós brasileiros nos acostumamos a chamar essa fase de mata-mata, um termo que não só expressa o caráter de verdadeiro duelo entre equipes, como também pode ser lido pelo ponto de vista, digamos, “cardíaco”, pelo potencial que apresenta de acelerar o coração e deixar lá em cima os níveis de adrenalina de qualquer cristão. Ou, como costuma dizer um conhecido comunicador, “Haja coração!”.

Essa fórmula de disputa, que sem dúvida emprestou um novo colorido à maior competição esportiva do planeta, foi instituída pela Fifa a partir do mundial de 1986. Antes disso, acontecia com menos frequência, sendo utilizados como critérios para desempate as campanhas das seleções ao longo da competição ou itens como os empregados atualmente apenas na primeira fase, como saldo de gols, gols marcados, confronto direto e, novidade nessa copa, menor número de cartões amarelos.

A primeira grande experiência da seleção brasileira com esse modelo de disputa foi emocionante – como sempre é – mas também traumática, com a equipe sendo eliminada nos pênaltis, depois de um empate em um a um com a França, num jogo que ficou marcado pela penalidade perdida por Zico, exímio cobrador, mas que desperdiçou a sua chance de dar a vitória ao Brasil no tempo normal. Esse jogo foi um exemplo daquilo que muitos reclamam nessa fórmula de disputa, que é a possibilidade de que sejam produzidas injustiças, como de fato aconteceu com a seleção brasileira, que saiu da copa depois de ter feito dez gols e sofrido apenas um, justamente aquele que levou a partida para a prorrogação e finalmente a disputa de pênaltis.

A outra experiência marcante da seleção com mata-matas veio em 1994, na copa do tetra. O teimoso zero a zero do tempo normal atravessou os infinitos 30 minutos de prorrogação e o campeão só foi decidido nos pênaltis. Como foi o sofrimento com final feliz, a gente mal lembra da angústia. Pelo princípio da busca constante do ser humano por prazer e felicidade – se estiver certo o Pai da psicanálise – a nossa mente só registra o chute nas arquibancadas do italiano Roberto Baggio, que sacramentou a vitória e aumentou as estatísticas de cardíacos no Brasil.

Na copa seguinte uma nova experiência com mata-mata. Dessa vez um duelo de gigantes com a forte seleção holandesa. Os cento e vinte angustiantes minutos terminaram no empate e deram lugar a mais uma decisão por pênaltis. Dessa vez, os brasileiros pareciam mais vacinados, afinal tínhamos Tafarel, o goleiro que havia defendido duas cobranças quatro anos antes, o que encheu de confiança a torcida. E o arqueiro gaúcho não decepcionou o Brasil! Pegou novamente dois chutes do time batavo, e ajudou a dar ao país a certeza de que vinha mais um título mundial. Infelizmente a história do futebol, que não tem nada com isso, tratou de jogar água fria no sonho do penta, depois de uma atuação da seleção brasileira muito abaixo do esperado, diante dos donos da casa. Aí os franceses, novamente eles, nos despacharam para casa.

A outra experiência com prorrogação e pênaltis só veio a ocorrer na copa de 2014, contra a sempre aguerrida seleção chilena. Imagina a situação, perder a copa em casa, pra um tradicional rival do continente e apenas nas oitavas de final? Pois foi o que ocorreu naquela tarde de inverno em Belo Horizonte. A decisão foi tão tensa que até o capitão do time, o zagueiro Tiago Silva, chegou a chorar em meio às cobranças, o que foi entendido por uns como fraqueza emocional incompatível com um capitão de seleção brasileira, mas por outros como sinal de que o grupo estava mesmo envolvido até o fio de cabelo com a competição.

Polêmicas à parte, o Brasil venceu sua terceira disputa de pênaltis seguida em copas do mundo, mais uma vez com uma participação decisiva do goleiro, desta vez Júlio César, que segurou uma cobrança, mas também com a ajuda da trave num chute do batedor adversário. Apesar do alívio e da alegria do momento, para muitos a eliminação precoce que poderia acontecer teria nos poupado do melancólico e traumático desfecho daquela copa, o famigerado 7 x 1, no mesmo Mineirão, o maior vexame da história do futebol brasileiro.

Mesmo em partidas em que não foi preciso chegar a prorrogações e penalidades, o teor de adrenalina foi grande. Principalmente em um esporte como o futebol, o mais imprevisível e ilógico de todos, sujeito a tantas variantes, a ideia de decidir um ciclo de trabalho de quatro anos numa única partida é realmente desafiadora e garantia de emoções fortes. E olha que não existe mais o chamado “Golden gol”, rapidamente apelidado de “morte súbita”, que só apareceu na copa de 1998 e nunca mais foi adotado. Esse sim um verdadeiro teste cardíaco!

E nós brasileiros, participantes de todos os mundiais até agora, vamos ficando cada vez mais acostumados a esse tipo de emoção, o que em nada alivia os momentos de tensão e adrenalina cada vez que se aproxima um mata-mata de copa do mundo. E assim vamos pra mais um. Que venha o México e depois mais três até o hexa. Que o futebol continue levando alegria para os milhões de corações brasileiros!


Por Sandro Gomes | Professor, escritor, mestre em literatura brasileira e revisor da Revista Appai Educar.


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