“Empurrõezinhos digitais” – Abra os olhos!


Entrevista com Fabio Pereira – Parte 2

Terminamos a primeira parte da entrevista, em que o nosso entrevistado Fabio Pereira, estudioso do tema Economia Comportamental, explicou que a maioria das nossas decisões é influenciada por fatores irracionais, pela falta de atenção, pela ausência do contexto completo quanto a toda informação necessária para as tomadas de decisão, por fatores emocionais etc.

Ele também mencionou que existem dezenas de vieses inconscientes que nos ajudam a entender quais fatores influenciam as tomadas de decisão e como influenciar essas decisões. Por isso, o conhecimento profundo desses vieses torna possível criar pequenas intervenções nos ambientes em que tomamos decisões para influenciar pessoas a optarem por uma ou outra decisão. Cada intervenção dessas é denominada “nudge” – termo de autoria de Richard Thaler e Cass Sunstein, que pode ser traduzido como “empurrãozinho”.

Mas o nosso entrevistado foi além do mundo físico. Com a sua pesquisa, ele nos trouxe uma importante contribuição quando uniu a área da Economia Comportamental e o mundo digital. Vamos conhecer um pouco mais sobre essa história?

Andréa: Graças à sua pesquisa, Fabio, já sabemos que no mundo digital esse conceito também está presente. Conte o que sãos os tais “Empurrõezinhos Digitais” (Digital Nudges).

Fabio: Os Empurrõezinhos Digitais são intervenções estrategicamente criadas com o objetivo de influenciar pessoas a tomarem uma ou outra decisão, muito semelhante ao que acontece no mundo físico, como já explicamos detalhadamente na parte 1 da entrevista.

Andréa: Você aprofundou o estudo do tema e afirmou que, muitas vezes, o mundo digital toma decisões por nós. Como isso ocorre, de que forma são pensadas as intervenções que nos influenciam?

Fabio: No mundo da criação de produtos e interfaces digitais, existe um poder enorme nas mãos das pessoas de UX (User Experience), Experiência do Usuário, e XD (Experience Design), Design de Experiência. Essas pessoas têm o poder de arquitetar os ambientes de tomada de decisão. E é no momento de decidir de que modo apresentar opções para os usuários que se torna essencial entender como o ser humano toma decisões.

Andréa: Para compreendermos melhor, você pode nos dar um exemplo de como atuam os designers da experiência?

Fabio: Posso, sim. Há o caso de uma experiência que eu mesmo vivi. Em uma das equipes de criação de produtos digitais em que trabalhei, precisávamos escolher como apresentar as opções para compradores de seguro. Comprar seguro é complicado, não é? Há muitas opções, é cobertura disso, cobertura daquilo, e para um determinado produto o comprador poderia escolher 511 opções diferentes. Para simplificar o produto para os compradores, fizemos uma personalização escolhendo as 3 melhores opções de pacotes para o comprador, baseados, entre outros fatores, em sua profissão. Se a pessoa fosse fotógrafa, viriam 3 opções, se fosse mecânica, seriam 3 outras opções, algo assim:

Dessa forma, das 511 possibilidades de combos, os compradores poderiam escolher 3. Claro que, depois de ter escolhido um desses 3, outras opções poderiam ser adicionadas ou retiradas da “opção padrão” selecionada. É quase como ir ao McDonald’s, pedir um Big Mac e apenas dizer “sem cebola”. É bem mais fácil do que montar o sanduíche todo do zero. Por falar em McDonald’s, limitar o número de opções de produtos foi exatamente uma das estratégias que possibilitaram o crescimento em escala da rede. Só que, diferentemente de sanduíches, no caso de produtos digitais a flexibilidade é bem maior. Usamos uma técnica muito poderosa, a personalização, que é um dos pilares das telas mais inteligentes, como explica Shlomo Benartzi em seu livro The Smarter Screen.

Andréa: No mundo digital, os designers da experiência arquitetam onde posicionar cada um dos elementos na tela, quais opções devem mostrar primeiro, da escrita até a imagem, não é assim?

Fabio: Sim, quando eu entendi isso, ficou claro o poder enorme que as pessoas de UX e XD têm. Elas arquitetam onde vai estar o checkbox, o que vai estar escrito, quais opções devem ser mostradas primeiro etc.

Existe um poder enorme em decidir o nome das opções:
• Não quero receber ofertas – (pede para sair).
• Quero receber ofertas – (pede para entrar).

E se as opções já vierem marcadas, tudo se inverte: Não quero receber ofertas – (pede para entrar); Quero receber ofertas – (pede para sair).

O mais interessante é que, intuitivamente, pensamos que só precisamos “pedir para sair” se algo já estiver selecionado, mas existe todo um jogo de como fazer o design das opções. Percebeu?

“Com grandes poderes vêm grandes responsabilidades!”, já dizia o sábio tio do Homem-Aranha. Os criadores de produtos digitais têm a grande responsabilidade de arquitetar o que os cidadãos digitais vão usar, de forma que isso resolva alguma necessidade deles ao invés de simplesmente tentar lhes vender algo que não querem ou de que não precisam.

Andréa: Fabio, a nossa vontade é continuar conversando com você por horas e horas, pois o conteúdo que você discute é muito, muito interessante para nós, que somos consumidores no mundo digital, mas precisamos concluir nossa conversa de hoje. Você tem alguma dica para aprofundarmos nossos conhecimentos nessa área?

Fabio: Eu preparei uma surpresa para vocês, professores… Estou deixando de presente, logo abaixo, o link para baixar o meu livro em pdf, com todo o aprofundamento sobre o tema.

Agradeço a oportunidade de falar para um grupo tão importante da sociedade, os professores, que são os curadores desta nossa era, responsáveis por orientar aprendizagens e proporcionar uma conscientização sobre diferentes temas que permeiam a vida, dentre eles o da Consciência Digital.

http://www.caroli.org/BaixeCDigital/

Andréa: Obrigada, Fabio, porque, mesmo em férias na Tailândia, você reservou algumas horas para conversar com um grande público aqui do Brasil, compartilhando o seu conhecimento. Estamos muito gratos pela entrevista e pelo presente (o livro). Desejamos muitas realizações e felicidade!


Por Andréa Schoch | Mestre em educação, especializada em formação de professores e consultora Appai por meio da EAD.


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